Embora eu seja apreciadora das
artes em geral, tenho que confessar que algumas vezes abdico do direito de
apreciar um filme, uma peça, uma novela, um livro, só pelo impacto que imagino
que ele poderá causar em mim.
Um excelente exemplo pode ser
aquela versão da Paixão de Cristo criada por Mel Gibson. Só em ver os trailers
e ler os comentários na época em que foi lançado, decidi que não queria assisti-lo
de forma alguma, em virtude do excesso de violência que as imagens traziam. Ainda
mais que, desde criança sempre tive uma reação curiosa quando assistia às
versões anteriores desse trecho do evangelho. Por mais que saiba da morte de
Cristo crucificado, toda vez que chega naquela parte em que Pilatos pergunta ao
povo se deve libertar Jesus ou Barrabás, ainda torço para que escolham
Jesus.
Para que possam me entender melhor,
cito outro exemplo um pouco diferente: quando li o livro “Marley & eu” tive
acessos de choro tão profundos quando chega a hora da morte do cão, que tive
que interromper a leitura por várias vezes, para me recompor e ao final tinha os olhos todos inchados e o rosto tão abatido que parecia ter saído
mesmo de um velório. Então, quando lançaram o filme, decidi não ir ao cinema,
já imaginando o mar de lágrimas que tomariam conta de meus olhos e a cara que
ficaria quando acendessem as luzes.
Pelo mesmo motivo, até hoje, não
tinha lido o Diário de Anne Frank. Como é uma história muito comentada e
verídica, achei que não queria conhecê-la a fundo, para não me abalar tanto. Li
“A menina que roubava livros” e já pude ter uma noção da dor embutida nessas narrativas.
Pois foram os tempos que estamos
vivendo, com uma ameaça no ar de agressão à democracia e do medo que surge lá
no fundo de que episódios tão obscuros como os que aconteceram no passado
possam ressurgir, me fizeram recorrer à leitura justamente do “Diário de Anne
Frank” (já tenho em mãos outro título, que também havia excluído de minha lista
de leitura, “O menino do pijama listrado”,
para ler na sequência).
A um dia do segundo turno das
eleições para presidente, estou na metade do livro de Anne, cujo
desfecho, ao contrário do das eleições, conheço bem, mas, temo que chegue. O desfecho do livro não há como mudar, já está
escrito. Das eleições, nós escreveremos amanhã.