Com a ideia de que influência não
é cópia e que não há escritor sem leitura, começa a conversa no nosso III
Encontro de Escritores e Leitores, acontecido ontem no espaço do Kas Tattoo, em
Guarulhos.
Como o tema desta vez era “Criação,
Estilo e influência do autor”, o mediador, o poeta César Magalhães Borges, começa
lembrando que não podemos negar que somos influenciados pelo meio em que
vivemos, pela língua que falamos, pelos padrões culturais a que estamos
submetidos. “Ninguém faria uma poesia, um conto, um romance, se não aprendesse
dentro desse caldeirão da cultura”, afirma.
O poeta lembra que é o nosso
contato com as outras artes, com a obra do outro, que nos faz começar a escrever.
“Sequer falaríamos se não estivéssemos em um grupo que fala”. Além disso, mesmo aquele cantador ou poeta que
por algum motivo não aprendeu a ler e escrever criou sua arte de ouvir outros
cantadores.
César Borges ainda comenta uma
frase tão infeliz quanto absurda que ouviu de um pretenso escritor - “Claro que
eu conheço Drummond. Mas não leio para não me influenciar”, esse autor teria
dito em determinada ocasião.
Para o mediador, o ato de se
influenciar pela leitura pode ser comparado àquelas bonequinhas russas, as “Matrioskas”,
porque quanto mais se lê um autor, mais se vai tirando camadas de dentro dele e
assim enriquecendo seus escritos.
Muitos sãos os exemplos de
autores cuja influência pode ser notada em suas obras.
A escritora Rosinha Morais cita a
polêmica existente a respeito da dúvida se Machado de Assis leu ou não o
romance Madame Bovary, de Gustave Flaubert. Guilhermina Helfstein e Alaercio
Zamuner também comentam sobre as influências de Machado de Assis, que teriam se
iniciado a partir do empenho de sua esposa a apresentar-lhe os livros. “Pega os
primeiros romances dele, a maneira de escrever, tem muito da escola francesa.
Quando ele vai para Memórias Póstumas de Brás Cubas, aí é Spencer (*), é Shakespeare
(**)”, diz Alaercio. Seria a habilidade de transformar coisas corriqueiras em textos
psicologicamente profundos.
César Borges cita ainda o poeta
inglês do século XVII – John Donne: “Nenhum
homem é uma ilha, completa em si mesma; todo homem é um pedaço do continente,
uma parte da terra firme. ... A morte de qualquer homem diminui a mim, porque
na humanidade me encontro envolvido; por isso, nunca mandes indagar por quem os
sinos dobram; eles dobram por ti”.
De mesma inspiração, lista o
romance “Por Quem os Sinos Dobram”, do escritor norte-americano Ernest
Hemingway e o álbum de Raul Seixas com o mesmo título, “Por quem os sinos
dobram”. Acrescenta também o poema “Os Sinos”, de Manuel Bandeira, que explora
o ritmo da cidade do interior marcado pelos sons dos sinos, relatando
nascimento, morte e ressurreição. A partir desses, Alaercio Zamuner revela ter
sido influenciando e criado uma crônica mencionando os sinos, na ocasião da
morte de um tio.
Quando os autores e leitores
presentes são incentivados pelo mediador a citar suas influências, a autora
Eliza Muratori afirma que achava não ter sido marcada por ninguém, que escrevia
apenas sobre suas verdades, mas que pensando bem, após aquela explanação, ela
encontra em seus escritos uma forma “Sidnei Sheldon” de criar – começando pelo
fim e aguçando a curiosidade do leitor.
Guilhermina Helfstein também
hesita em detectar seu gosto por Gregório de Matos e Padre Vieira como seus formadores,
porém, César Borges atesta que vê claramente sinais desses autores na obra da
escritora.
Carlos Alberto Cardoso Pereira
afirma gostar de ficção, mas aquela que tem um sentido, como as criações de Júlio
Verne, por exemplo.
A escritora Salete afirma ter se
contagiado pela crônica poética, pelo aglomerado de palavras de Mario de
Andrade.
Já a autora Talita Salvador conta
que em sua faculdade de publicidade havia aprendido o conhecido lema “nada se
cria, tudo se copia”. Afirma ser
impossível alguém inventar algo que não tenha influência de nada. Conta ser
leitora do britânico J. R. R. Tolkien, especialmente da trilogia “O Senhor dos Anéis”
e de Dan Brown (Código Da Vinci).
Wagner Pires revela-se leitor de Shakespeare,
de Camões, Cervantes e diz também que sofre influência pelo ambiente cultural
do Rock.
Alaercio revela suas bases a
partir de seus comentários e diz que a própria escolha do tema para esse
encontro, feita por ele, teve origem na obra sobre Guimarães Rosa, na qual vê semelhanças
com “A divina Comédia” (Dante Alighieri).
A autora desse texto e blog,
obviamente presente e ligada na discussão, revela ter se inspirado a escrever a
partir da leitura de “Cem Anos de Solidão”, cujo autor também foi alvo de seus
estudos durante o curso de jornalismo, com “Relato de um Náufrago” e “Notícias
de um Sequestro”, todos eles de Gabriel García Márquez. Rubem Alves também é um
autor que a cativou e que a fez gostar de escrever sobre coisas simples da
vida, como o tempo, o envelhecimento etc. ”Também me sinto influenciada pela
televisão, pelos telejornais e pelas novelas”.
Acrescentando mais um conceito e
tentando fechar a sessão de discussão, César Borges relata concordar com o
pensamento da antropofagia de Oswald de Andrade e confessa “comer” elementos de
todas as artes, do cinema, da pintura, do romance, da crítica, da filosofia. “Isso
vai me trazer algo quando for escrever”, conclui.
Então, continuemos a criar a partir de nossa “alimentação”!
(*)Herbert Spencer
foi um filósofo inglês e um dos
representantes do positivismo.
(**) William Shakespeare foi um poeta, dramaturgo e ator inglês, tido como
o maior escritor do idioma inglês e o mais influente dramaturgo do mundo.
Lançamentos:
“O pardal espião”, Eliza Muratori – Dia 12 de Novembro, das
18h às 20h, Rua Alvares Machado, 22 – 1.o andar, São Paulo.
“Vida a granel.
Histórias de supermercados”, César Magalhães Borges – Dia 19 de Novembro, na Galeria
Metrópole Av. São Luís, 187 - Centro Loja 29, 2º andar São Paulo e Dia 07 de
Dezembro, no Espaço Novo Mundo, avenida Salgado Filho, 1453, em Guarulhos/SP.
Alaercio Zamuner
estará lançando em breve seu livro de
crônicas, Monte-Sionenses: Chão e Estrelas.
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