No
meio da noite, na escuridão de meu quarto, minhas mãos, que involuntariamente repousavam
entrelaçadas sobre meu peito, foram tocadas por alguém, que julguei ser um
menino. Não consegui ver seu rosto, mas vestia uma camiseta de largas listras
horizontais. O horror tomou conta de mim. Um grito forte e dolorido ficou preso
em minha garganta. Em vez disso, consegui apenas um gemido. O desespero fez meu
coração disparar. O ar já começava a me faltar, quando, felizmente, consegui
despertar daquele terrível pesadelo.
Horas antes havia participado de um interessante
encontro literário, ocasião em que lemos e analisamos o terrível conto de Allan
Poe, O Coração delator. Através dele, um sádico assassino narra em detalhes
como planejou e executou a morte de seu eleito – pobre velho cuja única culpa
era ostentar em seu rosto um olho azul esbranquiçado que enchia de pavor seu algoz,
a todo o momento, lembrando-lhe um abutre. Ao dar cabo de seu plano e ocultar o
corpo embaixo do assoalho, orgulhoso de seu feito, o narrador ainda conta como
recebeu os policiais vindos para investigar um possível crime, do qual ele se
gaba, por se considerar totalmente insuspeito.
O conto de Poe termina com o
assassino acusando-se a si próprio e apontando o local onde escondera os restos
mortais da vítima, cujo corpo esquartejado ainda expõe, a sons cada vez mais
altos, apenas para seu carrasco, o bater incansável de seu coração horrorizado
e assustador.
Foi com meu coração ainda disparado,
que após despertar daquele horrível pesadelo, por algum tempo que não sei precisar
qual, me mantive parada, estática, na mesma posição em que me encontrava no
sonho, com medo, tentando encontrar uma explicação razoável para aquela
ocorrência apavorante. A arritmia me apavorava ainda mais, com o receio de me
levar a um possível enfarte.
Passado esse tempo, que ainda não
sei precisar o qual, restabelecido o batimento cardíaco normal e afastado um
pouco o pavor, levantei-me, lavei o rosto e tomei um belo gole de água. Havíamos
comentado ao final da noite, sobre a possibilidade de um pesadelo, ao abordarmos
tema tão soturno e macabro. Além disso, eu havia devorado fora de hora, um
misto quente caseiro, apesar de saber que dormir de estômago cheio, poderia me
provocar pesadelos. Sim, foi o sanduíche, com certeza! De qualquer forma, implorarei
ao professor uma mudança radical de gênero e de autor. Quem sabe, Vinicius de
Moraes, Drummond ou Machado. Serão mais que bem-vindos!
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