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O bom samaritano

“Um homem ia descendo de Jerusalém para Jericó, e caiu nas mãos de assaltantes, que lhe arrancaram tudo e o espancaram. Depois foram embora e o deixaram quase morto. Por acaso um sacerdote estava descendo por aquele caminho; quando viu o homem, passou adiante, pelo outro lado. O mesmo aconteceu com um levita: chegou ao lugar, viu e passou adiante pelo outro lado. Mas um samaritano que estava viajando, chegou perto dele, viu e teve compaixão. Aproximou-se dele e fez curativos, derramando óleo e vinho nas feridas. Depois colocou o homem em seu próprio animal, e o levou a uma pensão, onde cuidou dele”. Lucas 10,30-34.

Um gay ia caminhando pela avenida Paulista, quando foi abordado e espancado por uma gang de SkinHeads. Depois que ele estava desacordado de tanto apanhar, foram embora e o deixaram ali, quase morrendo. Um pastor que passava pela mesma calçada, viu e o ignorou, seguindo adiante, a caminho do culto. Um político também passou e desviou do caminho. Afinal, nem era época de eleição. Um morador de rua o viu e teve pena dele. Jogou água em seu rosto, e achando o celular em seu bolso, o usou para chamar uma ambulância.

Um torcedor do Palmeiras, saindo do Allianz Parque, foi cercado por torcedores de um time rival e seriamente agredido com socos e pontapés. Abandonado quase sem vida em uma praça, foi avistado por um advogado, que não quis perder tempo em socorrê-lo, pois tinha uma importante audiência no fórum. Uma bela mulher chocou-se com aquele corpo todo ensanguentado, fez uma foto para postar no Instagram e seguiu para o salão para fazer as unhas. Foi socorrido por um Corintiano que vestia a camisa do seu time, que tinha acabado de ganhar de aniversário.

No parágrafo acima, apenas substitua o palmeirense por uma pessoa de direita e o corintiano por uma de esquerda. Depois faça o inverso. Coloque o de esquerda no lugar do palmeirense e o de direita no lugar do corintiano. Tudo é possível.

Uma mulher negra estava sendo impedida de descer pelo elevador social de um prédio. A moradora que a impedia disse que o seu lugar era no de serviço. Alguns ocupantes do elevador ficaram inertes, alegando pressa para descer. Um jovem influencer fez um vídeo na mesma hora e o postou, fornecendo à vítima material para processar a criminosa por injúria racial.

Uma moradora de rua foi espancada por seguranças, quando tentava furtar dois pacotes de carne seca de um supermercado. Algumas pessoas que viram a cena em vídeo a acusaram de ser uma ladra qualquer e apoiaram os homens que haviam batido nela. Muitos se apiedaram de sua situação e da violência sofrida.

Existem muitas e muitas versões para essa parábola. Qual você conhece?

 

#crônicas #críticasocial #violência #fome

Comentários

  1. Belo texto, Fátima! Vivemos tempos sombrios, de muita injustiça, egoísmo, falta de solidariedade e empatia!

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    1. Não é mesmo. Tinha escrito esse texto outro dia, mas não havia publicado. Um comentário em um grupo de Whatsapp sobre o vídeo da mulher tomando a rasteira, me fez decidir a postar. Obrigada por ler e comentar. Você é show!

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  2. A omissão, muitas vezes, é tão nociva quanto o próprio mal feito.
    Seu texto promove reflexão, a fim de que cada um olhe pra si mesmo, e se pergunte: o que tenho feito? e o que tenho deixado de fazer?, E que deveria ter feito.

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    1. Que bom que leu e comentou, Jerônimo. É isso. Acho que a gente precisa refletir continuamente sobre tantas coisas que estão acontecendo no mundo. Essa reflexão precisa ser livre de preconceitos. Obrigada mesmo!

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  3. Pois confreira Fátima. Assim caminha a humanidade. Compaixão é meramente uma palavra. Nós precisamos de ação e enquanto não acontece os seres vão sendo punidos por sua inércia e desprezo por aqueles que são seus irmãos. Esquecemos que Somos Um. Eu Sou Aura

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    1. É isso, confreira Aura. Mas nós trabalhamos com as palavras, que podem nos fazer refletir e aos outros, e assim estimular boas ações, e boas palavras... Muito obrigada pela leitura e pelo comentário!

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  4. O ser humano tem atitudes surpreendentes!
    É complicado julgar...às vezes, a ajuda vem do lugar insólito, donde nunca esperamos.
    Belíssimo e apropriado texto para reflexão, resignação e compartilhamento.
    Grata, confreira Fátima pela generosidade da partilha.

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    1. Fico imensamente feliz que tenha gostado. Como aparece como anônimo, não sei quem está escrevendo exatamente. Mas sei que é uma confreira ou confrade da AGL e fico muito feliz pela gentileza de ler e comentar.

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    2. Agora já soube quem escreveu. Obrigada, querida confreira Antonia Vaz.

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  5. Eu acredito que apesar de parecer que só um terço da humanidade é solidária, o que tenho observado é que as pessoas estão mais atentas as mazelas humanas , talvez um olhar até poeta mas é o que tenho sentido, principalmente o nosso povo brasileiro, é um povo bom e muito solidário ,eu pelo menos sinto assim.

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    1. Sim, acredito mesmo que a maioria é, felizmente. Só fico assustada às vezes com a naturalidade com que as pessoas se posicionam a favor da violência. Eu agradeço pela leitura e pelo comentário. Pode se identificar? É que saiu como anônimo.

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  6. Seu texto é excelente, a temporalidade não! Minha mãe era negra, logo eu também sou. Sofri preconceitos por isso décadas antes do Sr Jair ser candidato a presidente, assim como os fatos narrados por você. Este cidadão que citei ficou no poder por 4 anos, sendo metade de mãos amarradas pela pandemia e outros órgãos, já o atual ficou 16 é mudou uma geração.

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    1. Mas o que têm esses dois senhores a ver com meu texto? Eu o escrevi impulsionada por um comentário em um grupo de condomínio, em que a pessoa comemora a agressão que uma mulher, moradora de rua, sofreu de seguranças de um supermercado ao ser acusada de roubo. Lembrei de outros episódios de violência em que sempre me vem à mente a parábola do bom samaritano. Foi isso. Não entrei no mérito sobre governantes. De qualquer forma, agradeço a leitura e o elogio.

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  7. Infelizmente, ao atualizar a parábola do bom samaritano, vamos encontrar muitas histórias parecidas,pois com tanto conhecimento adquirido o ser humano se esquece do principal que é o amor e o respeito ao semelhante. Sendo assim,vive uma inversão de valores e usa ferramentas que deveria usar para o bem, para a destruição.
    O que assistimos há poucos dias em um mercado no Bom Clima,é um pequeno sinal da brutalidade que é feita com os desprotegidos e menores da sociedade.
    Alguns passam à deriva,enquanto outros apoiam a covardia de um que se diz "segurança". Segurança de que, do que?
    Temos na prisão sem provas e sem direito a nada,mas de 1000 pessoas, pagando crimes que não cometeram e, aonde está o pessoal dos direitos humanos?
    Precisamos de bons samaritanos para salvar vidas que estão sendo perdidas.
    Estimada confreira Fátima, agradeço pela oportunidade que nos deu e avante. Clóvis Domingues

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    1. Verdade, confrade Clóvis. Muito grata por dedicar um pouco do seu tempo para ler e comentar.

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  8. Gostei. Conhecia a parábola, às novas ficaram sensacionais

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    1. Agradeço muitíssimo a leitura e o comentário!

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  9. Parabéns pelo texto e a reflexão. Muito bons!

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    1. Obrigada, amiga. Sua opinião é muito importante.

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  10. Só hoje tive oportunidade de ler seu ótimo e oportuno texto. Por essas e muitas outras razões, escrevi na revista da AGL que o ser humano tem demonstrado ser um animal irracional. Ou, muitas vezes, por agir de forma pretensamente racional, esquece que tem um coração.

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    1. Pois é. Acho que o contexto social e político que vivemos acaba induzindo a isso. Cabe a nós, pequenos ou grandes influencers (da família, da vida, da sociedade) o dever de tentar reverter essa tendência. Nossas palavras são a ferramenta. Fiquei extremamente feliz por seu retorno. Sua opinião é muito importante, bem como a de todos que dedicaram um pouco do seu tempo aqui. Obrigada!

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  11. Oi Fátima!!
    Estas situações ilustradas por você acontecia antes de Jesus durante e após, chegando até os dias de hoje!
    Por esse motivo está nas escrituras esta parábola para que possamos ler escutar, debater e colocá-la em prática mas infelizmente falta a leitura o debate o tempo afastando assim do amor ao próximo da caridade da humanidade!
    Feliz aquele que pode ser O Viajante como nas escrituras eu sou

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    1. Agradeço por ler e comentar. Espero que possamos sempre refletir sobre isso e nortear nossas ações de forma coerente. Obrigada, mais uma vez.

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