sábado, 10 de agosto de 2019

Pai&Filhos&Álcool


A proximidade do dia dos pais nos induz a refletir sobre a relação pai e filho, sobre as influências que um exerce sobre o outro, sobre as responsabilidades, os prazeres, as dificuldades, as barreiras que podem se colocar no meio dessa relação.

Entendo que só a parte boa seja objeto das postagens nas redes sociais, nas peças de propaganda, nas conversas e reuniões em família. Faz parte de nossa tendência, na maioria das vezes positiva, de reforçar coisas boas, momentos felizes e conquistas em nossas vidas.

Por esse motivo, mais uma vez, peço desculpas por trazer à pauta assuntos não tão agradáveis de ler, ao estarmos próximos de tão importante data comemorativa. Mas afinal, essa é a proposta do meu livro Código 303. Considero de suma importância uma reflexão profunda sobre a relação Pai&Filhos&Álcool.

Outro dia fui a um churrasco de amigos de um amigo. Fui muito bem recebida naquele grupo e passei momentos agradáveis, é verdade. Porém, uma situação que presenciei me preocupou grandemente. O homem que estava pilotando a churrasqueira o fazia durante todo o tempo e de maneira muito competente. Servia a todos, o tempo todo, carnes mal e bem passadas, linguiça, frango, tudo que é comum em um churrasco. Ele também tinha sempre nas mãos uma lata de cerveja e vigiava as mesas para não deixar ninguém de copo vazio. Era um excelente anfitrião.

Só essa atitude não seria tão reprovável, mesmo que ele tenha embebedado meu amigo, que não sabia dizer não, mas, afinal de contas estávamos em uma festa. Não é o que se costuma fazer em ocasiões como essa? Além disso, ninguém era obrigado a beber tanto. Bastava dizer “não, obrigado”. Será? Deixando essa questão de lado, o fato é que a reunião era em comemoração ao aniversário de sua filha adolescente que fazia 13 anos. Ainda, ignorando tudo isso, a principal razão de minha indignação foi o diálogo e a ação que veio após começarmos a comentar meu livro sobre alcoolismo.

“Eu posso ser personagem do seu livro”, dizia ele em tom de brincadeira. Eu apenas sorria, embora não achasse aquilo nada engraçado. Para reforçar sua tese ele indagava o filho, de 10 anos: “Desde quando o pai está bebendo?”. O garoto respondia para atendê-lo. “Desde hoje cedo, pai”. “E o que foi que o pai bebeu?”, continuava em tom de orgulho. “Vodka e cerveja”, contava o filho. O homem orgulhava-se de ter bebido tanto, por horas seguidas e aparentemente continuar de pé e conseguindo manter-se relativamente sóbrio (ao menos na sua visão).

Indagar o filho daquela forma, fazendo-o cúmplice de sua embriaguez não bastou. Para minha surpresa e indignação em dado momento ele ofereceu cerveja ao filho, que bebericou no copo do pai. Foi quando achei por bem intervir. “Não faça isso, por favor,”. Não se dá bebida a uma criança, adverti. “Ele já provou, mas, não gosta”, defendeu ele.  “É por isso que eu dou pra que ele prove e não goste. Assim não vai beber na rua”. Tentei argumentar mais uma vez, mas, foi inútil. Visivelmente entristecida, resolvida a colocar aquelas crianças em minhas orações e mais tarde pensar no que mais poderia fazer, deixei para ele um exemplar de meu livro, com a esperança de que o lesse e se convencesse a abandonar aquele comportamento.

Para completar essa história selecionei alguns trechos de depoimentos do Código 303 que têm relação com o assunto. Eles dispensarão explicações:

“Durante minha infância e juventude, sempre me entristeceu não poder trazer meus amigos em casa. Tinha vergonha que presenciassem meu pai bêbado”.

“Meu pai sempre foi muito violento. Nós éramos quatro meninas. Um dia, estávamos todas no quarto, apavoradas porque ele havia bebido muito. Ele entrou com um revólver na mão e disse que se não parássemos de chorar ele nos mataria”. Ana, filha de um alcoolista.

“Experimentei o álcool pela primeira vez aos seis anos de idade. Como era costume das famílias que moravam na roça,..., todos se sentavam à mesa na hora do jantar. Meu pai tomava uns golinhos de cachaça antes das refeições e não deixava de oferecer aos filhos”. Júlio, um alcoolista em recuperação.

#alcoolismo

#consumoexcessivodealcool

#bebida

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