Hoje é carnaval. Mas também não é. Uma contradição causada por um vírus cruel, que vem nos atormentado há mais de um ano e que nos condenou à ausência de muitas coisas, dentre elas a comemoração dessa festa maravilhosa.
Sim, para mim o Carnaval sempre foi uma festa grandiosa e imperdível. Quando criança, minha mãe me levava às matinês de salão e também para acompanhar os singelos desfiles de Rua de Campinas (sem querer ofender minha cidade, mas em comparação aos do Rio de Janeiro, por exemplo). A partir de meus dezessete anos, comecei a frequentar os bailes noturnos, que aconteciam em diversos clubes como Bonfim, Cultura, Regatas, Guarani. Embora eu tenha sido sempre torcedora da Ponte Preta, me via por vezes cantalorando o hino do clube rival, cantado à exaustão nos intervalos de cada baile que acontecia no ginásio localizado na Avenida Princesa D’Oeste. Nos primeiros anos da faculdade, eu cheguei a recusar convite para passar os quatro dias de folia na praia, para não perder tais bailes. Mas o meu sonho maior era sair em uma escola de samba. Consegui concretizá-lo em 1998, na Vila Izabel. Uma experiência mágica, que ficou na minha memória para sempre.
Eu podia ficar contando aqui muitos detalhes dessa aventura e de como ela se tornou possível, mas o verdadeiro motivo para essa crônica é outro. Acabo de visitar o canal A Liter Ação, do amigo Roman Lopes, e comecei a responder no espaço reservado aos comentários, ao seu vídeo postado no YouTube “Carnaval é ou não é arte?”. O “comentário” começou a ficar grande demais tanto para o site como para o grupo de WhatsApp do qual ambos somos membros e onde acabaram surgindo também discussões sobre o tema.
Concordo plenamente com todas as suas considerações a respeito, quando ele diz que o Carnaval é uma autêntica manifestação de arte, com enredos que provocam reflexão, que engloba uma série de categorias, como música, dança, escultura, pintura, a despeito de seu caráter mercadológico e às vezes alienante, que sempre recebeu críticas de variados grupos de pessoas.
Já vi e ouvi algumas defendendo que o carnaval não deveria existir, que é dinheiro jogado fora, que é uma festa que desvirtua as pessoas, que as leva a cometer obscenidades, a beber em excesso, usar drogas, fazer sexo livre etc. Como o próprio Roman menciona, existem outras manifestações de arte que passaram a ser objeto de exploração mercantil, ou que contém excessos de variadas condutas, mas que porém não sofrem tanto preconceito como o Carnaval. Ele citou o Rock In Rio, como exemplo. Grandes espetáculos, de vários gêneros, desde óperas, peças teatrais, espetáculos de dança, exposições e tantos outros, também têm seus desvios de finalidade.
Para mim, além de ser uma festa que transborda alegria e energia, que extravaza criatividade cultural e dedicação espontânea, também é um importante atrativo turístico, que fatura, emprega, faz girar de modo relevante a economia do país.
Roman fala em seu vídeo sobre as diferenças entre os carnavais de Rio de Janeiro e São Paulo. Confesso que no passado já fui preconceituosa em relação a São Paulo. Sempre pensei que era uma festa que pertencia aos cariocas e que acabava sendo copiada pelos paulistas. Achava que São Paulo deveria investir mais em Parques, Teatros, Cinemas, Feiras, Convenções, Competições Esportivas (Futebol e Fórmula 1, especialmente), Restaurantes, Gastronomia em geral, que no meu entender eram mais a sua “praia”. Mas com o tempo e com a ajuda das transmissões televisivas, passei a deixar esse sentimento de lado e a valorizar a capacidade da cidade de reinventar a festa, justamente com suas características próprias.
Algo que faltou comentar foi a existência também dos blocos de rua, presentes no passado e que tiveram sua força renovada nos últimos tempos nas duas cidades mencionadas, além de se manter firmes em muitas cidades do interior paulista e em outros estados, como Minas Gerais, por exemplo. São para mim uma versão daqueles de salão que como comentei, me davam muito prazer em frequentar. Sou também verdadeiramente apaixonada por marchinhas de carnaval, especialmente as mais antigas.
Lembro ainda o Carnaval Baiano, do qual sinceramente não sou fã e que considero algo bem diferente do que tratamos até agora. É outro tipo de festa que predomina no Nordeste, pelo qual, se não manifesto apreciação, guardo grande respeito pelo amor de seus componentes, pelo número de participantes que alcança a cada ano e pelo também apelo turístico e empregador que representa, além de considerá-lo certamente uma efervescente manifestação cultural.
Em relação à dúvida que originou a matéria impulsionadora da discussão, um Editorial da Revista SP Arte (365, de 11/02), sobre a ausência de arte carnavalesca nos museus do Brasil, entendo que muito deveria ser explorada. Sei que existem algumas exposições pelo país com o tema Carnaval, sobretudo no Rio e em Salvador, mas sem dúvida, haveria espaço de sobra para a cobertura do tema. Sempre me corta o coração quando circulo pela cidade de São Paulo nos dias que sucedem os de carnaval e me deparo com as grandes esculturas dos desfiles se deteriorando ao sol e à chuva. Ao menos, em caráter temporário, isso caracteriza uma exposição ao ar livre, pós-festa. Além dessas, que são extintas, sei que as escolas reciclam materiais, fantasias e até obras completas e isso talvez explique porque a maioria não vai para museus permanentes. De qualquer forma, seriam, sem dúvida, grandes e valorosas exposições.
Feliz Carnaval virtual e sem aglomeração, por favor!
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