segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

Por decreto

No último dia de 2018 queria fazer um pedido especial àquele que assumirá à presidência amanhã: por favor, edite um decreto garantindo a todo brasileiro a posse de um trabalho, de uma educação e de um sistema de saúde dignos. 
Que o texto garanta ainda infraestrutura básica em todas as favelas, atividades esportivas e culturais disponíveis para todos os seus moradores. 
Que um dos parágrafos estipule administrações competentes nos presídios, impedindo o uso de celular, armas e drogas pelos detentos, fazendo com que trabalhem e estudem durante o cumprimento de sua pena e que a cumpram com tempo proporcional ao seu delito.
Que haja um trecho garantindo o fim das desigualdades no país, com a extinção de privilégios para determinados cargos e impedindo que poucos tenham o poder de estipular seus próprios rendimentos. A garantia por decreto de salário digno aos professores, médicos e policiais também será adequada.
Que o instrumento também exija de todos ações efetivas para a preservação de nosso meio ambiente.
Finalmente que haja um empenho geral, especialmente por parte dos governantes, em busca da paz.
Qualquer outro item de posse é dispensado.
Obrigada.
Feliz 2019! 

sábado, 29 de dezembro de 2018

Uma vida em contas


Estamos na era das faturas digitais – as árvores do planeta agradecem – mas há 20 anos era diferente. As pessoas costumavam acumular toneladas de papeis e seus comprovantes de pagamento, muitas vezes até acima do prazo estipulado por lei, em sua maioria cinco anos. Felizmente, a partir de 2009 as empresas ficaram obrigadas por lei a fazer constar em uma fatura a declaração de quitação dos anos anteriores, permitindo que se descartasse parte do volume acumulado. De uns anos para cá, aos poucos, os pagadores vêm sendo cada vez mais estimulados a receber apenas uma fatura digital, por e-mail ou via SMS.
Na casa de meu pai há um armário que estava repleto de caixas de documentos, os quais eu praticamente ignorava. Até que o próprio móvel resolveu dar uma forcinha pra minha memória: meses atrás a velha estante veio abaixo, praticamente me obrigando a dar um destino para tudo aquilo. Na época, a única atitude que tomei foi colocar as dez caixas de arquivo morto no carro e transferi-las para o quarto da bagunça aqui do meu apartamento.
Só agora, na última semana do ano, resolvendo tirar o nome “bagunça” desse cômodo, abri as caixas. Encontrei faturas e comprovantes de 1988 a 2005, organizados por dia, mês e ano. Contas de luz, telefone, internet, condomínio, mensalidade de faculdades, cursos, cartões de crédito, extratos bancários. Uma estranha sensação tomou conta de mim. Lembrei de todo o sacrifício que fiz para manter em dia aquelas contas, quantos malabarismos,  quantas vezes entrei no cheque especial, quantos empréstimos bancários e até no financeiro de lojas tive que contratar. Que infinidade de juros absurdos deixei nos cofres desses agentes financeiros! O cobertor era curto e eu ficava sacando de um lado para cobrir o saldo negativo do outro. Não foi nada fácil. Não que agora seja, mas, hoje estou um pouco menos sufocada e mais controlada nos gastos.
Havia faturas de cartão que tinham o nome de minha querida mãe, que aumentaram ainda mais a saudade que sinto dela. As contas telefônicas me lembraram das “broncas” que eu dava por ela falar demais com minha irmã ao telefone, de fixo para celular, o que jogava o valor lá para cima. Achei um processo de um salafrário que passou a conversa nela e lhe vendeu um purificador de água fajuto, para o qual eu deixei sete cheques pré-datados que ele descontou juntos, no mesmo dia. Tínhamos tantos problemas em casa que resolvi abafar o caso, para não deixá-la mais nervosa. Engoli o prejuízo e desisti de recorrer à justiça, também por falta de tempo, porque eu trabalhava em outra cidade.
Junto a um carnê da escolinha de futebol de meu sobrinho, achei um “contrato” firmado por ele quando tinha dez anos se comprometendo a estudar e a se comportar bem, para que eu bancasse a despesa. Achei um recado escrito à mão de meu pai para mim e uma carta minha para ele (como eu ficava a maior parte do tempo longe, era comum nos comunicarmos assim).
Ao rasgar todos aqueles documentos (guardei apenas o bilhete, a carta e o “contrato”) senti o peso dos anos nas costas e a constatação de que vivemos para pagar contas. Apesar disso, resolvi olhar também para o outro lado: ter tantas contas pagas significava que eu tinha tido moradia, telefone e acesso à internet (nem sempre havia sido assim), planos de saúde (que felizmente foram pouco utilizados ao longo de todo esse tempo), alimentação, vestuário, eletrodomésticos, carro, entre outras regalias que muita gente não tem. Além disso, se estavam pagas é que porque eu tive um salário fixo para arcar com todas elas. Tive o orgulho de amparar minha família quando foi necessário. Estava tudo ali, uma vida em contas, um privilégio de poucos pelo qual só tenho a agradecer a Deus.
Se você tem contas pagas, agradeça também. Se tem algumas em atraso, tenha fé em Deus e se prepare para o que ele lhe reserva.
Feliz contas em 2019!

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Bate-Papo e Sessão de Autógrafos

06 DEZ | QUINTA-FEIRA
20h: Bate-Papo e Sessão de Autógrafos com a autora guarulhense Fátima Gilioli | Auditório 3 – Dom Quixote
Livro: Código 303 Uma reportagem sobre o alcoolismo, a doença da negação
Parque Linear Transguarulhense
Av. Transguarulhense – Parque Continental
Entrada Gratuita*
Obs.: ao final do bate-papo haverá sorteio de livros entre os presentes

sábado, 1 de dezembro de 2018

Atendimento especial


Sábado é dia de ficar em companhia de meu pai de 88 anos que tem Alzheimer. É um velhinho carismático, querido por todos, mas que precisa ter sempre alguém por perto. Pela manhã, preparei o café, separei os remédios que ele toma e resolvi dar uma corridinha rápida até o laboratório para entregar umas amostras para exames (aquelas que são uma chatice, mas, necessárias). Pensei comigo, “em no máximo vinte minutos vou estar de volta”.

Em menos de dez minutos cheguei lá e peguei a senha 82 (atendimento normal e não prioritário porque estava sozinha). Sentei-me e logo descobri que estavam atendendo a número 68. Incluindo as preferenciais o atendimento estava bem demorado. Observei que no papel já havia o aviso – previsão de atendimento em 28 minutos, apenas para a triagem.

Comecei a ficar aflita, pensando no meu pai sozinho. Fui até uma das atendentes e perguntei se para entrega de amostras a senha era a normal mesmo e ela me respondeu que sim. Voltei para a cadeira já pensando em desistir. Apesar disso, fiquei lá.

Após algum tempo, ainda preocupada, resolvi explicar minha aflição a elas, já me preparando para uma negativa, já que todos ali também deveriam ter motivos para querer ir embora rapidamente.
“Você me desculpe, mas estou preocupada com meu pai”, eu disse. “Ele tem Alzheimer e o deixei sozinho em casa”. A atendente olhou bem nos meus olhos e pareceu entender a situação: “Pode deixar, me dê o protocolo que te atendo, só não sei quanto tempo vai demorar para a enfermeira te chamar”.  Nessa hora, outra moça apareceu no balcão e ela agiu rápido. “Você pode levar as amostras dela?” “O pai tem Alzheimer e ficou sozinho em casa”. “Pode vir comigo”, ela ordenou. Agradeci imensamente às duas. Dois minutos depois eu já estava saindo de lá e correndo de volta para o apartamento.

No caminho fui pensando que nenhuma delas duvidou de mim um só instante. As duas agiram com uma rapidez inacreditável. Afinal, eu poderia ser uma dessas pessoas que adoram sair por aí furando filas. Lamentei, com a pressa, não ter perguntado seus nomes - grandes profissionais preparadas para atender os clientes com a dignidade que merecem.

Meus olhos se encheram de lágrimas no carro e também agora quando revolvi contar para vocês essa história.