sábado, 13 de novembro de 2021

"Ficções: a Arte de fingir"



A arte é uma representação da vida. Apesar de não ser a verdade em si, ela nos representa de alguma forma. Um livro que conta fatos, históricos ou um livro reportagem, embora possa ser elogiado pelo seu formato, não pode ser classificado como arte, não pode ser ficção, teoricamente, não deve estar fingindo. Obviamente há a questão da subjetividade, bem como as tão atuais “narrativas fake”, mas não nos cabe nesse momento enveredar por esse caminho. Afinal, a proposta do XIV Encontro de Escritores e Leitores é discutir o tema “Ficções: a Arte de fingir".

    Originária do Latim, a palavra “ficção”, vem de “fictione” e significa criação. Podemos, então, com base na realidade, imaginar uma narrativa literária que não é real. Também a palavra de origem latina, fingir, “fingere”, seria “modelar o barro” e passa a ser usada para significar simular, fantasiar, inventar, burlar de alguma forma a verdade. Na arte é mais como criar algo que se parece com a verdade, mas que não é a verdade. Dedos em Inglês são “fingers” e é com eles que escrevemos ou moldamos o que queremos fingir. Insistindo ainda na definição das palavras, não é a toa que “play” em Inglês traduza-se como “brincar”, “tocar” e até como “peça teatral”. “O artista é o adulto que não esqueceu como se brinca”, disse um filósofo francês.

    Além de passar para sua obra a sua bagagem, a sua vivência, o autor não necessariamente precisa se representar. Ele pode observar o outro e representá-lo em sua obra. Pode ainda usar em um texto, por exemplo, o pronome “eu”, mas estar representando o outro, bem como utilizar “ele” e estar falando de si. Essa análise deixa mais claro o significado de fingir na literatura e nas artes. Além disso, o autor pode estar colocando em sua criação o que vive, o que vê e também inventando algo. Como disse Ferreira Gullar, se a realidade não basta, a gente precisar criar algo que esteja fora da vida. Se a verdade é chata, não é tão interessante, nem tão engraçada, pode-se “arrumar” a história. Esse poder está na mão do artista que vai fazer alguém viajar na sua criação.

    Tal como na literatura, também na dança, no teatro, em toda criação, o artista precisa fazer uma imersão, entrar no personagem, fingir com toda a sua determinação e talento. Mas apesar do fingimento, tanto o escritor como o leitor, no caso da escrita, precisa acreditar no que está lendo. Trata-se da verossimilhança, um conceito que precisa ser seguido na arte. Ainda que seja uma fábula, uma fantasia, ela precisa ser crível. Assim como vivemos intensamente o que sonhamos, vivemos a arte que consumimos. É o que nos faz chorar com a morte de um personagem, torcer para que outro se dê mal ou esperar um final feliz.

    Ainda que saibamos que a arte é fingimento, muito nos alimentamos dela para nos tornar aquilo que somos. O fingir da arte pode tocar, pode contribuir, pode influenciar tanto quanto a realidade, mesmo sem podermos quantificar o alcance ou a intensidade dessa contribuição.

 

Dicas de leitura

Dom Casmurro – Machado de Assis

A Revolução dos Bichos - George Orwell

Admirável Mundo Novo - Aldous Huxley

Vidas Secas – Graciliano Ramos

Quarto do Despejo – Carolina Maria de Jesus

Poema Meditação XVII - John Donne

Obras de Júlio Verne

 

Dica de filmes

Pixote, a lei do mais fraco e Quem matou Pixote?

Blade Runner – dirigido por Ridley Scott

Desejo e Reparação – Dirigido por Joe Wright,

 

#literatura #arte #ficção 

terça-feira, 2 de novembro de 2021

Eu não sou nada fã de Halloween

    Eu não sou nada  fã de Halloween.  A festa,  que  muitos acreditam  ter sido importada dos EUA, mas que é originária da  Irlanda,  passou  a  ser  mais comumente comemorada  no Brasil  há  algumas  décadas,  no  meu entender,   por  iniciativa  das escolas    de  Inglês.  A  criançada  logo  se animou  de  olho  nas  guloseimas  que  lhe são oferecidas  pra  evitar  as  “travessuras” e os adultos passaram a curtir as fantasias cujas  fotos  vão  rapidamente  para  as  redes  sociais e rendem inúmeras curtidas.

    Também não vou ficar aqui defendendo o Saci-Pererê, personagem do folclore brasileiro que se tornou uma espécie de contraponto à festa americana. Acho uma grande besteira ficar alimentando essas competições nacionalistas em plena era da globalização.

    Por que então eu comprei um saco de balas e fiquei à espera da visita das crianças fantasiadas do meu condomínio? É simples, porque não vejo nada demais na animação delas e acho divertido ver suas carinhas felizes, mesmo por trás das máscaras. Nem todos agem da mesma forma. Há aqueles que até reclamam a presença delas, se incomodando com o alvoroço que provocam. São pessoas amargas, que parecem não terem tido infância.

    Vivemos um Halloween todo dia, em que monstros de todo o tipo e tamanho nos assombram cada vez que ligamos a TV no noticiário, que ouvimos o rádio, que acessamos os jornais via internet ou em papel (como eu ainda faço de vez em quando), ou quando nos deparamos com as fake news pelas redes sociais. Pandemia, violência, racismo, homofobia, desemprego, fome, desgoverno, queimadas, destruição das florestas, poluição, agrotóxicos, mudanças climáticas, alta do dólar, inflação de dois dígitos e por aí vai. Coisas que nos assustam, que nos atingem e com as quais não podemos nem negociar. Não se troca essas maldades por doces.

    Como não me alegrar com essa criaturinha mascarada que veio bater à minha porta? Doces ou travessuras?

#halloween #crônicas #diaadia