Sonhador, romântico, boêmio, marginal, irresponsável são
muitos os rótulos que vêm sendo atribuídos aos escritores em suas diversas
versões televisivas ou cinematográficas. Para tentar captar essas imagens e detectar
suas distorções em relação à realidade, colocamos em pauta o tema “Reflexões
sobre como a figura do escritor é retratada nas telas".
Em sua introdução, o escritor César Magalhães Borges usou
como recurso buscar exemplos dessa representação de forma cronológica, partindo
da novela “O feijão e o sonho”, produzida e exibida pela TV Globo em 1976. Baseada
no romance de mesmo título, de Orígenes Lessa, a história contrapõe os dois
personagens principais como obstinados, ora pelo “feijão de cada dia”, papel da
esposa, Maria Rosa, ora pelo “sonho”, perseguido pelo marido, Campos Lara, poeta,
escritor, que permanece alheio às dificuldades de sustento e sobrevivência da
família.
Outra pérola relembrada por ele foi a série “Os Waltons”, exibida,
no Brasil, de 1975 a 1981. Ela relatava a vida e as provações de uma família
das montanhas da Virgínia dos anos 1930 e 1940 através da depressão financeira
e da Segunda Guerra Mundial, sob o ponto de vista de John Boy, o filho mais
velho, aspirante a ser jornalista e novelista. O que mais ficou marcado na
memória dos espectadores foi o desfecho padrão de cada episódio, com uma visão noturna
da casa, com as luzes das janelas sendo apagadas, menos uma do andar superior, a
de John Boy, reforçando uma característica presente na rotina de alguns
escritores, que é a de escrever enquanto os outros dormem.
Na continuidade de sua explanação, César cita filmes de
terror e suspense, como “O Iluminado”, de Stanley Kubrick e “A Janela Secreta”,
ambos baseados em textos de Stephen King. Em meio a perturbações psicológicas e
fenômenos paranormais, presentes no primeiro, e ameaças por acusações de plágio,
no segundo, vemos escritores abalados e perdidos em suas carreiras literárias.
Acusações de plágio, aliás, são comuns em roteiros de
filmes, aparecendo também, por exemplo, em “As palavras”, de 2012, em que um
escritor frustrado encontra manuscritos de um livro e os publica como seus, com
enorme sucesso e, mais adiante, sendo procurado pelo verdadeiro autor.
“O Escritor Fantasma”, dirigido por Roman Polański, traz uma
atividade alternativa de um escritor, que é a de assumir o papel de “Ghostwriter,
escrevendo para que outro nome estampe a obra.
A relação do editor com seus autores é relatada na
cinebiografia “O mestre dos gênios”, contando a história do editor Max Perkins e
seu relacionamento com três grandes gênios da literatura, Ernest Hemingway, F.
Scott Fitzgerald e Thomas Wolfe.
O escritor romântico, sonhador, apreciador de épocas
passadas, é retratado na fantasia romântica “Meia-noite em Paris”, de Woody
Allen.
Em “Ficção Americana”, lançado em 2023, aparece o dilema de
um escritor negro, impelido pelo mercado a escrever sobre o universo dos negros,
enquanto sua opção original de escrita nada tem a ver com as questões raciais.
Em meio às inúmeras características atribuídas aos amantes
da escrita nas telas de TV e do cinema, entende-se que o conflito é necessário para
dar vida a essas criações, enquanto que a maioria das histórias de vida dos
escritores mortais, em sua rotina diária, muitas vezes banal e sem graça, não
renderia um bom roteiro.
*Texto criado com base nas discussões travadas durante o XXV Encontro de Escritores e Leitores, versão on line, pelo Google Meet, em 21/06/2024.
Dicas de novelas, filmes, peças e livros mencionados durante o encontro:
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